#MarçoVermelho: como os estereótipos influenciam na saúde da mulher
Por Equipe Cative!
Em 2019, criamos a campanha #MarçoVermelho para debatermos as diferentes vivências do ser mulher durante todo o mês de março. Em 2020, a campanha está de volta com novos temas em todos os canais de comunicação da Cative!
Quando o assunto saúde da mulher aparece nos grandes meios de comunicação, costuma ser abordado a saúde ginecológica e/ou o câncer de mama, mas a saúde de uma pessoa é mais do que seu aparelho reprodutor e por isso é tão importante ampliarmos o debate sobre o que significa uma mulher saudável.
Afinal, há vários pontos questionáveis nessa associação, a começar pela transfobia em associar mulher apenas a uma pessoa que carrega um útero, passando pela noção de que mulher serve apenas como procriadora até chegar no estereótipo da mulher cuidadora e/ou guerreira: aquela que não precisa de ajuda, então também não precisa de cuidados médicos.
Parece chover no molhado, mas ainda é necessário pontuarmos que as diferentes formas de ser mulher trazem diferentes desafios, inclusive no campo da saúde.
Nesse texto, então, vamos pontuar algumas perspectivas dos desafios que as mulheres têm no acesso a saúde para refletirmos o quanto as representações na comunicação influenciam na perpetuação desses estigmas.
Para que cuidado se a mulher negra é forte?
No Brasil vivemos uma epidemia de partos cesarianos — somos o segundo país no ranking, perdendo apenas para a República Dominicana. Parte desse fator se deve ao medo que o parto natural traz a milhares de mães. Mesmo com a política do SUS de parto humanizado, falta informação e acesso a esse direito.
E é claro que o recorte de raça vale para essa realidade também. Um estudo realizado no Mato Grosso aponta que uma mulher indígena tem seis vezes mais chances de sofrer violência obstétrica do que uma mulher branca. Dados do Ministério da Saúde mostram que 60% da mortalidade materna ocorre entre mulheres negras contra 34% da mortalidade entre mulheres brancas.
O acesso a saneamento básico e uma boa condição de moradia também afetam a saúde. Nisso, as mulheres negras também ficam atrás das mulheres brancas. Segundo o IBGE, 11,9% das mulheres negras vivem o chamado adensamento excessivo contra 7,7% das mulheres brancas. Em tempos de COVID-19, até o isolamento dentro de casa se torna privilégio no Brasil.
Então se você ainda não entendeu a importância de quebrar o estereótipo da mulher negra como fortaleza, eis outro dado: muitos médicos deliberadamente não cuidam de suas pacientes da mesma forma que cuidariam se ela fosse branca, pois ainda acreditam que mulheres não-brancas sentem menos dor. E esse estereótipo também contribui para mulheres negras receberem menos ajuda do que as brancas, afinal elas “aguentam” as dificuldades.
Mulheres trans não vão ao médico
Imagina viver uma vida evitando ir a um médico, hospital ou qualquer serviço de saúde por ter medo de ser discriminado durante a consulta. Essa é a realidade das pessoas trans no Brasil.
Em 2016, um estudo do Hospital das Clínicas da USP e da UFRGS com pessoas trans dos estados de São Paulo e do Rio Grande do Sul aponta que 43,2% dos entrevistados evitam usar serviços de saúde para evitar a discriminação.
Seja no desrespeito ao uso do nome social, onde muitos atendentes chamam o paciente pelo nome de batismo ou por médicos despreparados para atender essa população, o fato é que pessoas trans no geral negligenciam a própria saúde para evitar humilhações.
Os dados sobre essa população são tão raros que há apenas uma estimativa da quantidade de pessoas trans no Brasil: entre 752 mil e 2,4 milhões de brasileiros são pessoas trans.
Pessoas trans são desumanizadas o tempo todo: nos jornais que insistem em usar o nome de batismo quando noticiam algo sobre uma pessoa trans; nas produções culturais que não desenvolvem personagens trans com profundidade; no convívio diário com o destrato por pessoas transfóbicas chegando até a violência física.
O Brasil é o país que mais mata pessoas trans no mundo. Segundo o estudo “Transrescpect versus transphobia world wilde”, foram 331 pessoas trans assassinadas em todo o mundo, 124 delas apenas no Brasil. Além disso, 90% de mulheres trans e travestis são empurradas para a prostituição, o que as coloca em risco físico constante.
E todas essas dificuldades nos levam a debater outro assunto importante: a saúde mental das mulheres.
E a saúde mental da mulher importa?
Mulheres são mais acometidas pela depressão e ansiedade. Segundo a OMS, 7,7% das brasileiras são ansiosas e 5,1% deprimidas, entre os homens a taxa é de 3,6% para as duas doenças. E são 2,3 mortes por suicídio para cada 100 mil mulheres no Brasil.
O fato das mulheres desenvolverem doenças psicológicas é consequência direta de uma sociedade em que mulher e sobrecarregada é quase um sinônimo. A violência doméstica, o abuso sexual, gravidez, pós-parto, os diversos preconceitos (machismo, racismo, transfobia e capacitismo) e a responsabilidade pelos mais fracos na família (crianças, doentes e idosos) são alguns dos muitos fatores que levam mulheres a perderem sua saúde mental.
Em situações limite, esses dados aumentam. Cerca de 80% das mulheres em situação de cárcere tomam remédio para dormir e a taxa de suicídio entre elas é 20 vezes maior do que mulheres fora do cárcere. A situação insalubre a que são submetidas também ajudam a deteriorar sua saúde física e mental.
Com ataques constantes a sua cultura e suas terras, os indígenas estão vulneráveis a todo tipo de violência e isso se reflete também na saúde mental. Não achamos estudos com recorte de gênero, mas segundo o Ministério da Saúde a taxa de suicídio entre indígenas é de 21,8 mortes para cada 100 mil habitantes — o triplo da média nacional.
Todas as mulheres estão em risco. Segundo publicação da revista The Lancet, a taxa de depressão chega a 60% entre pessoas trans contra 5% da população em geral. No Brasil, a cada 10 jovens que se suicidam, seis são negros. O racismo e a transfobia são agentes importantes no adoecimento das mulheres.
Já passou da hora das autoridades olharem para a mulher não apenas como um útero e sim como um corpo completo, que precisa de diversos cuidados. Já passou da hora dos meios de comunicação, das marcas e de quem está por trás das produções culturais deixarem os estereótipos de lado na hora de representar as mulheres — especialmente as não-brancas, trans e mulheres com deficiência.
Há mulheres de todas as cores, formas, tamanhos, etnias e origens. Está na hora de vermos isso na publicidade, mas também entre os funcionários das marcas, como já alertaram as RPretas aqui.
É claro que como comunicadores não podemos tratar uma dor de cabeça ou a depressão de uma mulher, mas podemos fazer a nossa parte em derrubar os estereótipos nocivos.
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Confira abaixo todos os textos da #MarçoVermelho:
#MarçoVermelho: por que criamos?
Masculinidade tóxica: o que o Marketing tem a ver com isso?
Por que as mulheres precisam ser guerreiras
Você conhece as mulheres que estão fazendo História agora?
Quem cuida de quem cuida? : o estereótipo da mulher cuidadora
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